Não interessa o resultado. Não interessa que o Sporting tenha desperdiçado a oportunidade única de ganhar ao Benfica. Não interessa que, sem muito esforço, o Benfica tenha decidido atacar e marcar e o tenha conseguido. Não interessa que depois disso tenham faltado pernas ao Benfica. Não interessa que o Benfica tenha tido mais oportunidades flagrantes. Não interessa que o Benfica tenha tido 3 jogadores lesionados. Não interessa que o Sporting ainda não tenha dado o click para o nível dos títulos. Não interessa que a melhor contratação do Sporting esta época se chame Leonardo Jardim. Não interessa que essa contratação se tenha acagaçado e retraído quando não devia. Não interessa que o Markovic tenha tudo para ser um ídolo mundial. Não interessa que o Bruno Carvalho pareça um miúdo a festejar os golos do Sporting. Não interessa que o Rúben Amorim tenha feito um dos seus melhores jogos no Benfica. Não interessa que o lateral direito do Benfica, neste momento, tenha de ser o André Almeida. Não interessa que o Lima ande perdido em campo sem o Cardozo ao lado. Não interessa que o Maxi tenha feito uma falta - dura - só para amarelo. Não interessa que o golo do Sporting seja em fora de jogo. Não interessa o penalty claro sobre o Cardozo.
Nada disso interessa. Só interessa uma coisa: a luta de classes, como sempre! Só interessa que os apanha-bolas do Sporting sejam todos betinhos, com cabelo "à fodass".
Devemos agradecer ao Sporting. O Estádio Alvalade XXI é talvez o único lugar do mundo onde os betinhos fazem trabalho braçal. Mas o Sporting é um clube de viscondes, de aristocratas, seria de esperar que os betinhos dos apanha-bolas fossem mais leais, como todos os cavalheiros da nobreza devem ser. Mas não, postos perante um trabalho manual portam-se como todos os outros apanha-bolas da plebe e do proletariado: tentam sobreviver, usam a matreirice para ficarem com a boca fora de água, "esquecem-se" de devolver e apanhar as bolas quando ela pertence ao adversário, por vezes chegam a devolver-lhes a bola um bocadinho para o lado.
Há uns dias o A. e o P., dois homens, casaram-se. Um com o outro, sim. A lei entrou em vigor em Janeiro de 2010, mas foi a primeira vez que tive o prazer de festejar o casamento de duas pessoas do mesmo sexo.
Primeiro era para ser apenas uma ida ao cartório seguida de um jantar familiar, mas depois de muitas conversas e ideias acabou por ser um serão num hotel central de Lisboa. Nada de épico e faustoso, sem centenas de convidados e sem milhares de aperitivos e cocktails. Uma cerimónia simples, com música cantada por alguns dos convidados e pelo A., e um jantar acompanhado pela família e uns quantos amigos mais próximos, aqueles que nos acompanham mesmo quando não estão presentes.
A família. Deve ser duro assumir estas coisas perante a família. Nas famílias do A. e do P. não sei se ao princípio alguém estranhou alguma coisa, mas naquele dia estava tudo entranhado e mais do que aceite e mais do que feliz. Desde o "sim" até ao bolo, cortado como manda a tradição pelas mãos dos noivos e regados a champanhe. Afinal a tradição ainda é o que era, só que o bolo, desta vez, tinha as cores do arco-íris a sustentar o abraço dos dois "noivos-bonecos" confeccionados para a ocasião.
"Daqui me vou despedindo, pouco a pouco, lutando com a minha angústia e vencendo-a, dizendo um maravilhado adeus à água fresca do mar e dos rios onde nadei, ao perfume das flores e das crianças, e à beleza das mulheres. Um cravo vermelho e a bandeira do meu Partido hão-de acompanhar-me e tudo será luz."
Este é o prefácio do último livro de Urbano Tavares Rodrigues. Irá chamar-se "Nenhuma Vida" e chegou às mãos de Cecília Laranjeira - editora e amiga do Urbano - no início de Julho. Hoje o Urbano morreu, e a Cecília leu este mesmo prefácio para a TSF, comovida, esforçando-se por calar as lágrimas.
Aqui em casa o acordar foi entristecido pela notícia, e ouvir este prefácio de despedida durante o pequeno almoço, foi dos momentos mais emotivos da minha vida. A minha mulher amada, ao lado, não conseguiu calar as lágrimas. Eu fiz-me de forte, arrumei as minhas no canto dos olhos e continuei a trincar o pão. Por dentro tremi como não tremia há muito tempo. Fiz bem, não tenho direito a chorá-lo da mesma forma que ela. Para mim o Urbano só existe como militante comunista e como poeta de alguns versos que dele li, ela conhecia-o, leu-o e lembra-se do seu sorriso, o tal que dizem que era só dele. Resta-me compor este erro imenso, resta-me lê-lo com carinho, o mesmo que ele deixou a muitos que por cá ficam.
Hoje o Urbano morreu. Não quero saber quais foram as suas últimas palavras, para mim serão sempre as deste prefácio. Agora desarrumo as lágrimas do pequeno almoço e deixo-as cair enquanto as releio. A minha mulher amada não está em casa, não tenho de me fazer de forte.
Descobri um canal de Youtube que tem praticamente todas as canções dos Festivais RTP da Canção desde 1964 a 1994. Ao ouvirmos estas músicas, cronologicamente, vamos percebendo que o gosto português se foi alterando lentamente em relação ao resto do mundo ocidental. Quase sempre percebemos o que foi transportado dos anos anteriores para as novas músicas. Uma coisa é certa, este canal mostra como Portugal é um sítio onde o belo e o kitsch sempre andaram a pá, e sempre os separou uma linha muito ténue.
Quando era crianço não percebia patavina da vida. Ainda assim, e por várias contingências, aos 6 ou 7 anos sabia o nome dos Ministros, dos políticos mais importantes e via o Telejornal diariamente. E como todo o crianço tinha sonhos e desejos, e em altura de campanha e de eleições não era diferente. Gostava das cores, das feiras, dos mercados, dos beijos molhados na tromba dos políticos, dos apertos dados por mãos limpas a mãos calejadas, gostava da festa e do arraial.
Na noite das eleições, observar as projecções, os votos a chegarem, os partidos na montanha russa da percentagem, era melhor do que um jogo do Benfica. Em 1991, com 8 anos, o sonho era ver o PSR eleger Francisco Louçã. Fui um crianço triste nessa noite, esteve quase, mas não chegou. Em 1995, com 12 anos, já estava um bocadinho mais consciente, mas não muito. Nesse ano mantinha-se o sonho Louçã, e adicionava-se outro, ver o CDS, agora PP, chegar aos míticos dois dígitos. Louçã ficou ainda mais longe do Parlamento e o CDS-PP esteve quase, quase a chegar lá, mas no fim da noite o crianço voltava a estar triste.
Ontem pensava porque raio isto sucedera. Quando aos 14 ou 15 anos me tornei militante da JCP, com um pensamento ideológico estruturado ao mínimo mas agora totalmente consciente do seu rumo, olhava para trás e não me percebia. Hoje, aos 30 anos, descubro a resposta, mas não descubro a pólvora. É simples e imediato, obviamente que as mensagens que mais ouvimos na comunicação social são as mais facilmente absorvidas se não tivermos espírito crítico, então se se for um crianço...
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