Uma amiga foi despedida por ter feito greve no dia 27. Por razões de sigilo legal escuso-me a contar pormenores, mas o patrão disse ipsis verbis que não lhe renovaria o contrato por ter feito greve. Estava com um contrato a prazo, bem entendido, um contrato precário, como não podia deixar de ser. Ironicamente, e para azar dela, esse contrato acabava no dia 28...
Ela vai pedir apoio do sindicato, de movimentos, de advogados e do diabo a quatro, e felizmente que o vai fazer. Infelizmente, temo que será um caso de palavra contra palavra. Devíamos andar sempre com gravadores quando falamos com os nossos patrões e patroas, e devíamos pedir sempre à nossa companhia de telefones para gravar as conversas que temos com eles ao telefone. É que foi assim que ela foi dispensada, por telefone, uns minutos antes de acabar o trabalho.
Ela foi insultada, acusada, maltratada. Ela tem, agora, muita gente a dizer-lhe que "vês? bem te avisei que ia correr mal", e a dizer "mas parece que não conheces a realidade!" e ainda "foste parva!", que é algo que quem nos é próximo deve dizer-nos quando somos despedidos nestas situações. Se não o disserem estarão a incorrer no erro grave de não nos fazerem sentir mais culpados ainda. É que isto de termos convicções e lutarmos por elas é mesmo uma parvoíce, então não estamos fartos de saber que "o mundo é assim"?
E os colegas de trabalho? Bem, escuso-me a relatar o que lhe disseram porque não merecem tanto, e além disso, eles é que não são parvos...sabem que "o mundo é assim". Espero que sofram de insónias de classe.
Como ela, várias pessoas devem ter perdido os seus empregos por aderirem à Greve Geral de dia 27. Se voltavam atrás depois de perceberem o que lhes aconteceu? Provavelmente alguns sim, e justificadamente, mas espero que a maioria não, é que isto de ter uma espinha dorsal bem erecta é tão ou mais importante do que comer mais um prato de sopa por dia. Quando nos vergamos muito, é provável que regurgitemos o que comemos. A consciência pesada consegue dar muitos nós à barriga...
É claro que despedir alguém - ou dispensar, como é legalmente e politicamente correcto dizer no caso dos precários - por ter feito greve é mais do que ilegal e está bem explícito e explicado nas leis do país. Será que vai acontecer alguma coisa a esta empresa e a este patrão? Provavelmente não - volto a dizer, palavra contra palavra... -, mas os patrões e as patroas às vezes não sabem com quem se estão a meter. Ainda há por aí uns quantos de nós disponíveis para dar a cara uma e outra vez, disponíveis para levar a luta até às últimas consequências.
Imaginem onde estávamos se assim não fosse...
P.S. - se alguém me estiver a ler e tiver sido despedido por ter feito greve, ou conhecer alguém que o tenha sido, não hesitem. Peçam ajuda! Vão a um sindicato, falem com um movimento, movam vales e montanhas, mas não deixem os patrões, as patroas e o governo ficarem a rir-se da vossa cara de fome...
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